Por EULER BRANDÃO https://marcaganhajogo.com.br/quem-sou-2/ 03/06/20 12:51
A Tesla, montadora de carros elétricos norte-americana, é hoje o melhor exemplo de como uma estratégia de marketing bem planejada e executada pode render muito dinheiro às empresas. No caso dela, bilhões de dólares.

Em janeiro de 2020, a Tesla, fundada por Elon Musk, em 2003, superou os US$ 100 bilhões de dólares em valor de mercado. Em 1º de junho de 2020, superava os US$ 164 bilhões na Bolsa de Valores, numa valorização de 60% em valor de mercado em apenas 6 meses. E o fato inusitado: ela vale mais que o dobro do que valem suas centenárias concorrentes Ford e GM… somadas!
O que a Estratégia de Marketing tem a ver com o valor de mercado da Tesla

A pergunta que não quer calar: o que a Tesla fez para valer tanto? Como uma empresa de apenas 17 anos de mercado, e possuindo apenas 0,7% de participação no mercado mundial de automóveis, em 2019, conseguiu obter essa valorização recorde? A resposta está numa estratégia de marketing extremamente bem planejada e executada primorosamente.
Elon Musk não se cansa de alardear que a Tesla não faz propaganda porque não precisa. E, além disso, o que é real, possui uma despesa de marketing ínfima, se comparada ao investimento dos seus concorrentes (menos de 1% de suas receitas, em 2019). Mas essas afirmações são meias-verdades, e não contam toda a história.
O sucesso da estratégia de marketing vencedora da Tesla baseia-se em três premissas, todas muito consistentes, e fortemente alinhadas entre si: (1) a estética do marketing, aplicado tanto na identidade corporativa quanto nos produtos (*confira post neste blog sobre esse tema) ; (2) a inovação; (3) e o próprio Elon Musk, o fundador e atual CEO da empresa, como celebridade e garoto-propaganda da marca. Explico:
No quesito design, o apuro estético está presente em tudo o que a Tesla já criou até hoje. O cuidado com a identidade visual, partindo já do naming (a escolha do nome da empresa é uma homenagem a Nikola Tesla, que teve papel fundamental na pesquisa e desenvolvimento da eletricidade e dos motores elétricos). A identidade corporativa, compreendendo os elementos gráficos, fonte e ícone da Marca, está refinadamente presente nos carros, nas lojas, no site, nas estações de recarga e, até mesmo, nas baterias que armazenam a energia que move seus automóveis. E tudo isso para não falarmos do desenho dos carros, que chamam a atenção pela elegância e linhas fluidas, e identificam a empresa de maneira distintiva: são icônicos e emblemáticos, chamando a atenção por onde passam, mesmo de pessoas que não são muito ligadas ao mundo automobilístico.
A inovação, por sua vez, está presente na própria concepção da empresa. Ela é fundada em 2003 num momento em que o petróleo está abundante e barato, e sendo consumido em larga e crescente escala, apesar haver um discurso em favor da sustentabilidade, e da preservação do planeta, alertando sobre a necessidade da redução na emissão de CO₂. Em última análise, não faria o menor sentido em se investir no desenvolvimento da tecnologia dos carros elétricos quando o custo desta energia tende a ser maior que o uso de combustíveis fósseis (como a gasolina, o diesel e o gás natural). Um verdadeiro contrassenso no sentido da viabilidade econômica. Prova disso é que todas as indústrias gigantes montadoras de automóveis nunca tinham levado muito a sério o desenvolvimento de carros elétricos – não por falta de dinheiro.
A questão era que nenhuma das grandes marcas de carros mundiais apostava na viabilidade da produção de carros elétricos em larga escala, e por diversas limitações tecnológicas somadas ao baixo custo do combustível fóssil: a potência dos motores era baixa, a carga das baterias era reduzida (comprometendo a autonomia), a recarga era demorada, a indisponibilidade de pontos de recarga públicos… enfim, uma série de barreiras que tornavam a ideia da produção de carros elétricos um delírio. E a Tesla surge com uma concepção inovadora e de alta tecnologia, que derruba uma a uma essas barreiras, mudando o paradigma em relação à adoção da eletricidade como fonte viável de combustível para os carros. Baterias mais potentes e recarregáveis mais rapidamente, motores elétricos de alto desempenho, estruturas de carroceria mais leves, pontos de recarga nas principais vias das principais cidades e estradas americanas (inicialmente na Califórnia), acessórios de recarga doméstica mais eficientes. Tudo isso foi criado e desenvolvido sem ajuda governamental, a partir de empresas startups do Vale do Silício.
A mudança de paradigma foi tão emblemática que Elon Musk resume assim: a Tesla, ao invés de buscar tornar os automóveis existentes em carros elétricos, optou por colocar rodas num computador. Desse modo, por exemplo, os programas eletrônicos embarcados num Tesla passam por atualizações constantes, assim como nossos smartphones atualizam seu sistema operacional e os aplicativos. Brilhante, não? Portanto, não se trata apenas de alterar o propulsor do veículo, mas sim de produzir um aparelho de locomoção totalmente novo, que apenas se baseia no princípio do automóvel.

Por fim, e não menos importante, há a figura de Elon Musk. Considerada uma das mentes mais brilhantes nos negócios atualmente, e que talvez esteja transformando o mundo como fizeram Steve Jobs, Bill Gates, Thomas Edison… dentre vários outros gênios que, com sua engenhosidade, marcaram significativos avanços na tecnologia e, por consequência, na história da humanidade. E sua genialidade para os negócios extrapola a Tesla. Foi um dos acionistas do PayPal, e com a venda de sua participação nesta empresa ganhou um bom dinheiro.
Musk é hoje uma celebridade, e está presente na mídia de forma bastante intensa e frequente. É extremamente requisitado para palestras e entrevistas, e sua imagem é muito bem cuidada. De fala suave, transmite uma serenidade e muita segurança, construindo uma personalidade carismática. Tipo aquele cara que todo mundo tem vontade de tomar uma cerveja e trocar ideias. Mas tudo isso é muito bem planejado, e tem como propósito colaborar para a imagem de Marca de suas empresas, o que ele tem conseguido com retumbante sucesso.

Sua fortuna é estimada em US$ 37,2 bilhões pela Forbes, em maio de 2020 (24ª pessoa mais rica do mundo). Ele é também fundador e executivo de outras empresas, como a SolarCity, Neuralink, OpenAI e SpaceX. Esta última, responsável pelo projeto do foguete Falcon e da cápsula espacial Dragon. No dia 30 de maio de 2020, contratada pela NASA, a SpaceX levou com seu foguete e sua cápsula uma dupla de astronautas para a estação orbital internacional, marcando a volta do lançamento, em território norte-americano, de voos espaciais tripulados (algo que não ocorria há mais de 10 anos). Foi o primeiro do mundo realizado por uma empresa privada. O lançamento foi transmitido ao vivo para todo o mundo, por streaming e TV.

A escolha do ramo de atuação de suas empresas possui dois eixos principais: a utilização de energia limpa e eficiente (solar, eólica, cinética), e a mobilidade (seja ela transporte individual, de massa, ou ainda espacial). E a estratégia de marketing foi tão bem desenhada que todas as suas empresas operam de maneira sinérgica, a despeito de atuarem em mercados, à primeira vista, muito distintos.
O Marketing e a Propaganda
Voltando então ao nosso tema: a estratégia de marketing da Tesla usufrui dos três elementos citados neste post de maneira combinada, e da melhor forma possível: a estética do marketing, a inovação e a figura de Elon Musk. Por isso, avaliar o investimento de marketing da empresa apenas baseado em suas demonstrações financeiras anuais é insuficiente, e altamente impreciso. Traria uma falsa impressão de que bastaria a uma empresa, como no caso da Tesla, ter um ótimo produto e que, apenas com o boca a boca e o entusiasmo de seus clientes satisfeitos, ela construiria seu sucesso. Isso é extremamente importante, mas não vale bilhões de dólares.
A título de exemplo de como o marketing da Tesla é estratégico e nada barato, e como ela faz propaganda: numa das ações de promoção da SpaceX, quando ela realizou seu voo orbital inaugural com o foguete Falcon, ela lançou em pleno espaço um carro da Tesla, com um manequim astronauta como motorista, rumo a Marte. A transmissão também foi feita ao vivo, e esta imagem do Tesla, com um astronauta no volante tendo a Terra como cenário de fundo, rodou o mundo (e sim, a Terra é redonda). Através de websites você pode seguir a órbita e a posição na qual o Roadster Tesla dirigido por “Starman” se encontra no sistema solar. Qual será o custo de uma propaganda como essa?

Deste modo, assim como eu, desconfie de quem te falar que existem Marcas fortes que foram construídas sem uma consistente estratégia de marketing, e que nunca gastou dinheiro com propaganda. A estratégia está sempre presente: normalmente de forma explícita e, em alguns casos excepcionais, de maneira não formal (abordarei esse tema num post futuro).
Até hoje não conheci nenhum caso de uma Marca forte que não tenha uma consistente estratégia de marketing e investimento em comunicação e propaganda por trás de sua construção e posicionamento, e sou capaz de apostar que isso não existe.
Para saber mais:
Sobre a Estética do Marketing: https://marcaganhajogo.com.br/a-estetica-do-marketing-parte-1-starbucks-e-identidade-de-marca/
Acompanhe o carro da Tesla viajando no espaço: https://www.whereisroadster.com
Sobre Nikola Tesla: https://pt.wikipedia.org/wiki/Nikola_Tesla
Tesla Financial Report 2019: https://tesla.gcs-web.com/static-files/07bfcb70-aba1-4a27-af09-4f101678320c
TED com Elon Musk em 2013 (legendado):
Porque a Tesla não precisa de mídia paga (em inglês):